Etril

As filhas do crepúsculo

coven

Dizem que antes mesmo das coroas e dos reinos, as bruxas já caminhavam sobre a terra.

Elas não nasceram do pecado, como pregam os monges, nem da bênção dos deuses — mas de algo mais antigo, mais profundo.

Foram moldadas pelo mundo entre mundos, onde a vida e a morte se tocam sem se confundir.

Por séculos, aldeões juraram tê-las visto à beira dos bosques, entre a névoa dos rios ou à luz mortiça das luas partidas. Algumas curavam. Outras matavam. Todas eram temidas.

Mas o que poucos compreendem é que nem todas as bruxas são iguais. Seu poder, suas intenções e seus ritos variam conforme o sangue e o círculo ao qual pertencem.

As antigas escrituras falam de três linhagens — irmandades distintas, mas todas moldadas por um elemento do mundo natural: a floresta, a fera e a noite.

São conhecidas como Sylven, Ravennas e Nyxas.

Cada uma carrega o peso de uma maldição ancestral e o eco de um poder que nem o tempo ousa apagar.

Entender suas diferenças é compreender os próprios limites da magia — e o preço é se aproximar demais do que é sombrio.

Sylven — As Bruxas da Floresta

As Sylven são as mais antigas e numerosas entre as bruxas.

Habitam as florestas cerradas, onde o vento sopra nomes esquecidos e o musgo cresce sobre ossos de eras passadas.

Seu domínio é a vida em sua forma bruta — elas curam, envenenam, encantam e amaldiçoam com a mesma naturalidade com que o sol nasce e morre no horizonte.

São as criadoras das poções e dos feitiços simples, das ervas que despertam o amor e dos unguentos que trazem a morte. Algumas vivem em paz, servindo aldeias distantes como curandeiras e parteiras; outras se alimentam do medo e da ignorância, cobrando preços impossíveis por milagres temporários.

A floresta as protege e as esconde. Mas também as denuncia — quando uma Sylva é descoberta, as chamas das fogueiras sempre a encontram.

E assim, o povo teme o que não entende, e as bruxas aprendem a amar o silêncio das árvores mais do que o julgamento dos homens.

Ravennas — As Ani-Bruxas

As Ravennas nascem sob o signo das feras.

Sua magia é selvagem, pulsante e atravessa o limiar entre o humano e o animal.

Elas chamam os espíritos da terra, dos lobos, dos corvos, das serpentes. Alguns dizem que podem ver pelos olhos das criaturas que dominam; outros juram que elas se tornam as próprias feras quando a lua ascende em seu zênite.

O amor das Ravennas é possessivo, violento e raramente humano.

Seu toque carrega a febre da metamorfose e o perfume da selvageria.

Os antigos afirmam que a licantropia nasceu de uma maldição ravenna — o castigo de um amor proibido entre uma bruxa e um caçador.

Vivem afastadas, nas fronteiras das aldeias, guardando segredos que misturam sangue e instinto.

Para algumas tribos antigas, são protetoras da caça e dos rebanhos.

Para os templos, são heresia encarnada.

E para quem as encontra… são a lembrança viva de que as espécies “civilizadas” nunca deixaram de ser animais.

Nyxas — As Bruxas da Noite

Entre todas, as Nyxas são as bruxas mais temidas — e as menos compreendidas.

Nascem sob luas eclipsadas, e dizem que o próprio ar recusa o nome delas.

Sua magia não floresce; apodrece.

É o poder da ausência, da morte e da eternidade.

As Nyxas não invocam — elas chamam o que já foi.

Guiam os mortos, comandam sombras e fazem do sofrimento um idioma.

Quando passam por uma aldeia, o leite azeda, os cães não ladram e os sonhos tornam-se febris.

Dizem que em seus corpos o frio é constante, e que o toque de uma Nyxa é capaz de apagar a chama de uma vela e o calor de um coração.

Quase todas se voltaram ao mal, consumidas pelo próprio poder.

Mas há quem diga que foram as primeiras vítimas do medo por parte da civilização — caçadas, traídas e condenadas ao exílio nas profundezas da noite.

Seja por vingança ou por dor, hoje, onde há uma Nyxa, há silêncio, pranto e neve.

O Sangue das Bruxas

O sangue das bruxas é o mais antigo e perigoso dos mistérios.

Ele não corre apenas nas veias — arde, pulsa, murmura. É como se cada gota guardasse ecos de promessas antigas feitas à lua, à terra e ao esquecimento.

Por isso, onde quer que uma bruxa caminhe, o mundo a reconhece. A relva cresce sob seus pés, as chamas se curvam, e os mortos, às vezes, sussurram seu nome.

As bruxas podem conceber filhos com seres de todas as espécies — humanos, elfos, orcs e até demônios.

Seu ventre é fértil em poder, não em número: cada nascimento é um pacto silencioso entre o corpo e o caos.

Quando uma bruxa engravida, ela desaparece.

O mundo esquece o som de seus passos. As corujas cessam o canto, e até o vento parece perder a direção.

Elas apagam rastros, apaziguam espíritos e ocultam sua existência para que a criança — meio humana, meio mistério — possa crescer entre os mortais, livre do estigma do feitiço.

As meninas, ao alcançarem a adolescência, sentem o Chamado; um sussurro ancestral que invade os sonhos, conduzindo-as até o covil de suas mães, ou até uma mentora do mesmo círculo.

É uma voz que não fala — recorda.

E quando a ouvem, já não há retorno.

A partir desse momento, são marcadas pelas Luas e pelo destino, entrando no caminho de sua Iniciação, onde o sangue desperta e a magia se reconhece.

Os meninos, por outro lado, raramente despertam o dom.

Alguns sentem lampejos de poder, como brasas que nunca viram fogo, mas logo são dominados pelo encanto das próprias criadoras.

Na juventude, tornam-se acompanhantes, servos e, por vezes, amantes das bruxas.

São belos, fortes e movidos por uma devoção que não compreendem.

O toque das bruxas lhes concede vigor e desejo, mas também consome o que têm de mais humano — a dúvida, o livre-arbítrio, a razão.

O amor deles é pura entrega, e nessa entrega repousa a ruína.

E assim o ciclo se repete: o sangue das bruxas jamais se extingue, apenas muda de corpo, de rosto e de era.

Enquanto houver escuridão, haverá uma canção na noite… e uma filha prestes a ouvir o Chamado.

O Legado das Três Linhagens

As Sylven continuam a viver onde a floresta respira.

Algumas se escondem sob o disfarce de curandeiras e erveiras, oferecendo alívio e veneno com a mesma mão.

Outras preferem o isolamento das matas profundas, onde o tempo esquece os nomes e a própria natureza as reconhece como filhas.

Mas todas carregam o mesmo dilema: salvar ou corromper, o dom que sustenta ou destrói.

As Ravennas vagueiam pelas margens do mundo civilizado.

Guardam o instinto das feras e o orgulho de não pertencer a ninguém.

São pontes entre a carne e o espírito, entre o animal e o humano, entre a devoção e a fúria.

Dizem que quando um corvo pousa à sua janela e o vento sopra do norte, uma Ravenna está próxima — observando, escolhendo se você é presa, aliado… ou lição.

As Nyxas, por fim, são as sombras que caminham quando o resto dorme.

Não há registro vivo de uma Nyxa vista sob a luz do sol.

Elas surgem onde a dor se acumula, onde os mortos não descansam e onde o medo se transforma em oração.

São o espelho daquilo que a humanidade teme reconhecer: a beleza do fim.

E então há o Sangue.

O elo invisível que une todas as linhagens — floresta, fera e noite — em uma só herança.

O sangue que nunca seca, que atravessa gerações e queima nos sonhos de quem o carrega.

Ninguém sabe quando ou onde nascerá a próxima, mas os sinais sempre voltam: o silêncio das corujas, o frio sem vento, o luar sobre flores mortas.

Talvez você já tenha sentido algo assim — um arrepio que vem antes da chuva, um sussurro no meio da noite, uma lembrança que não é sua. Talvez o sangue delas ainda ecoe em algumas veias humanas.

E se houver uma chama em você — curiosa, inquieta, proibida — talvez seja o momento de perguntar: a qual círculo você pertence?

🌿 Sylven, filha da terra.

🐺 Ravenna, guardiã das feras.

🌑 Nyxa, senhora da noite.